Delineação significa basicamente saber “ler” a carta astral. É ler a soma dos significados, técnicas e métodos e chegar a uma conclusão. Há mais de um pensamento sobre o tema, então pensei em fazer um pequeno resumo:

O “método” da Síntese

A “síntese” é o pensamento que sintetiza as escolas modernas de astrologia. Basicamente se caracteriza pela ausência de método. Os defensores sempre apontam comparações com a astrologia como “arte” ou com “intuição”. Nos dois casos leia-se “cada um faz como quer”.

A síntese é um dos pontos que você sempre vai encontrar um monte de gente perguntando coisas como: “Faz vinte anos que estou estudando astrologia, mas ainda não sei fazer a síntese de tudo isso”. Por que tanta dificuldade ?

A raiz do problema está na maneira como a maioria das pessoas aprende astrologia,  através de um “livro de receitas”. Abra um livro de astrologia moderna. Pelo menos metade do livro está dedicado a receitas de bolo, do tipo, “marte em libra, você aprecia muito a arte e o convívio com os outros”.

Ora, o que acontece quando você reúne então todas as partes dessas receitinhas usadas separadamente ? Óbvio que você fica com um belo dum monstro, cheio de contradições. A pessoa é artística mas pés no  chão, alegre mas introvertida, apesar de gostar muito de seus amigos (e quem não gosta?), é meticulosa mas bagunçada.

É possível chegar a algum lugar usando a síntese? É até possível, mas o problema é justamente a falta de conhecimento organizado, hierarquizado e metódico. A tendência é se basear apenas na intuição, e intuição não é transmissível. Mas, se você está querendo aprender astrologia tradicional, a “síntese” como entendida pela astrologia moderna nunca foi usada, e você também não deve nem tentar.

O método de algoritmos

Há alguns escritos na tradição da astrologia que são parecidos com programas de computador:

  1. Veja A
  2. Se A for assim e assim, então X;
  3. Se X for igual a Y, então Z;
  4. se X não for igual a Y, então teste B;
  5. e assim por diante.

Um exemplo é o método geralmente descrito para encontrar o “Senhor das Maneiras”. Basicamente você:

  • Veja o signo do ascendente e procure se há um planeta nesse signo
  • Se não houver, procure um planeta que aspecte a lua e mercúrio
  • Se não houver, use o regente do ascendente

Há vários “algoritmos” desse tipo, principalmente na tradição medieval. Funciona ? Sorry, mas não.

Às vezes as pessoas se confundem com o estilo que os autores antigos usavam. A ordenação acima implica uma ordem de prioridade, mas isso não implica que eu deva ler a carta astral como se ela fosse um programa de BASIC ! Esse tipo de análise fascina a muita gente, principalmente com pensamento mais de “exatas”, mas o fato é que ele fere um princípio básico da astrologia: da organicidade.

Lembre-se… nunca haverá duas cartas iguais a serem analisadas. Portanto a astrologia tradicional, apesar de  ser técnica por natureza,  não é mecânica !

Somando tendências

Note, no exemplo acima, que para ver uma única coisa (o senhor das maneiras), necessitamos de vários indicadores. É possível que esses indicadores dêem informações contraditórias. Por exemplo, significadores do pai são, tradicionalmente:

  • O sol (às vezes se defende Saturno, se a carta for noturna)
  • o regente da casa 4
  • a parte do pai e o regente da parte do pai

Então o que fazer quando, por exemplo, o sol está em péssimo estado, e o regente da casa 4 em bom estado, etc ?

Não é exatamente possível somar as tendências. Uma indicação boa com outra má pode significar um estado médio, ou um que varia o tempo todo entre céu e inferno ?

Por exemplo, os astrólogos védicos costumam usar a “soma” de tendências. Primeiro olham o significador essencial do assunto, depois o regente da casa, mas eles sempre confirmam também com a carta divisional. Veja que é um procedimento bem análogo ao ocidental, mas com suas próprias peculiaridades “regionais”.

Em geral você pode pensar nesse processo como de confirmação. Há inúmeras possibilidades para um aspecto como sol em oposição à lua. Por exemplo você pode pensar em dificuldades na vida de casal. Agora olhe para a casa 7 e procure por confirmação ou não da tendência.

Almuten

Eu não sou muito fã do conceito de almuten quando usado indiscriminadamente. A teoria é que, para cada um dos assuntos da vida, como amor, dinheiro,você pega todos os indicadores, e tenta fazer uma “média ponderada” de quais são os seus regentes, a partir dos signos em que eles estão. Eu posso garantir que o Almuten Figuris funciona, mas o método me parece demasiado “mecânico”, e como já comentado antes, métodos mecânicos não costumam funcionar.

Morin

Morin é muito endeusado por astrólogos modernos que gostam de parecer mais chiques. Mas Morin, apesar de suas contribuições, era um reformista, e então “podou” de sua astrologia uma série de coisas que funcionavam, como partes arábicas, firdaria, profecção, termos, faces, inventou suas próprias triplicidades, etc. Basicamente Morin só usava as casas astrológicas e as regências.

Para Morin, o regente natural (por exemplo, vênus para o amor) só tem sentido em condições específicas, por exemplo se vênus é regente da casa 7 ou se está na casa 7, etc. De resto ele diria que ela não é realmente importante. Note que no caso anterior, a maioria dos astrólogos védicos sempre consideraria a condição de vênus, não importando sua relação com a casa 7.

Funciona ? Sim, em geral se o regente da casa está naturalmente ligado ao tema (como no caso o regente da 4 ser o sol, que naturalmente representa o pai), temos certeza que o tema vai ser realizado de alguma forma. Se o planeta é analogicamente contrário ao tema da casa, devemos esperar problemas. No entanto Morin exagerou muita coisa, e não deve ser tomado ao pé da letra. Há muito a ser aprendido no que ele descartou como “crendices dos árabes”.

Julgamento – integração dos testemunhos

Se você acompanhou discussões anteriores, conhece já a noção de testemunho. Cada um dos indicadores importantes de um tema, sejam eles naturais ou acidentais, oferecem seu testemunho para a qualidade,  quantidade, constância, etc, de um tema na vida da pessoa.

O astrólogo deve estar ciente então que os testemunhos vão obedecer a uma hierarquia, e cada testemunho vai ter que ser julgado em quanto a sua força, qualidade, etc. Mas como as cartas nunca vão ser iguais, o julgamento sempre vai ter uma componente subjetiva.

Note no entanto, que estamos muito longe da velha “eu julgo por intuição”. Antes era apenas um mero palpite. Aqui estamos falando de julgar, a partir de um conjunto de regras pré-definidas, uma série de indicações que aparece na carta até chegar a um resultado coerente, combinando técnica e experiência.

No exemplo dado lá acima, sobre o Senhor das Maneiras, ao invés de simplesmente seguir um “programa de BASIC”, o verdadeiro senhor das maneiras pode ser encontrado a partir de TODAS as considerações, dando pesos diferenciados a cada uma.

Por exemplo, se temos mercúrio aspectando a Júpiter, e a lua aspectando a marte, com vênus peregrina no signo do ascendente, e Júpiter como regente do ASC, o que fazer ? Poderíamos, no caso hipotético, dar preferência a júpiter, que aspecta mercúrio e é regente do ascendente, ignorando a vênus, que não tem dignidades no ASC, e marte, que também não está fazendo nada mais.

Ou poderíamos julgar que marte é mais importante porque é senhor da parte do espírito e da casa 9. Cada caso é um caso. Organicidade mas estruturada dentro da técnica.

Ou no caso do significador profissional. Damos prioridade a um marte cadente regente do MC, ou um vênus oriental ao sol peregrino ?

O que representa melhor seu dinheiro ? O regente da casa 2 em aversão ao seu signo, ou a júpiter na casa 10 aspectando fortuna ?

Não há respostas únicas, por isso que computadores não podem fazer esse trabalho. Mas também não é algo que é ensinado na base da receita de bolo e nem da resposta pronta. É necessário saber os princípios em profundidade, e depois vê-los aplicados em algumas centenas de cartas. Unindo técnica e experiência se conseguem os melhores resultados, muitas vezes independente do método.

Nota – Novo Blog

O novo blog http://astrologiapreditiva.wordpress.com foi criado e estava em espera até recebermos sua primeira pergunta, de nossa querida “Pafúncia” (ela que escolheu o nome, não eu). Pafúncia pergunta “quando vou comprar meu apartamento”.

Veja no novo blog a resposta para Pafúncia, e mande também sua pergunta para ser publicada no blog.

Comments

  1. Excelente tópico Yuzuru. Sempre é bom dar uma olhada na questão da filosofia da vida que a gente leva pra lembrar que muitas vezes reclamamos é de barriga cheia. E mesmo quando esse não é o caso, num adianta nada ir pro canto e chorar.

  2. Você inclui os luminares como candidatos à senhor das maneiras ou os exclui, como faz a tradição ptolomaica (olhando só a latitude da lua e os aspectos do sol ao senhor das maneiras)?

    1. Eu recomendo aos alunos a olharem os luminares como possiveis candidatos, mas se houver um outro, darem prioridade a esse outro. Por exemplo, temos sol e jupiter, dar preferencia a jupiter.

  3. Entendi a questão dos luminares. Mas (desculpe ser chato com isso) prioridade e preferência implicam escolha. Pode haver mais de um senhor das maneiras?

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